Até quando correr atrás do “mais”.
Sempre trabalhei com informação. Mais precisamente, 26 anos buscando, produzindo e transmitindo informação através dos programas jornalísticos de rádios e televisões. Era uma loucura deliciosa investigar os fatos, correr atrás dos furos de notícias, acompanhar polícia, governos, artistas, gente de todo tipo, o tempo todo.
Mas em poucos anos a reviravolta tecnológica foi tão gigantesca que às vezes parece que vou entrar em pane. Confesso que estou meio atordoada nesse universo em que precisamos dominar diversas plataformas, transitar pelas mais variadas áreas de conhecimento, falar de tudo, “conhecer” milhares de pessoas, ser multitarefas sem ser profundo em quase nada. Nunca transitei bem pelas superficialidades. Gostava mesmo era de me aprofundar, refletir. Ir à fundo nos cursos, nas poucas amizades intensas, no trabalho especializado, nos compromissos importantes. Agora, parece que nada é importante e tudo é urgente. Nada precisa ser, basta parecer. O tempo, que é tão raro, é gasto na busca desenfreada de satisfação, de emoção, de relacionamentos superficiais, de notoriedade passageira e do conhecimento prático, que em pouco tempo estará defasado. É preciso dar resultado! Sentença feita, sentença cumprida. A que preço?
É possível seguir essa lógica e manter a serenidade.
Chega a ser assustadora a superficialidade de aspectos da vida que já foram carregados de valor. Outro dia uma amiga me relatou a experiência do filho que levou o amigo para passar o fim de semana com ele. Foram 3 dias, sem nenhum contato dos pais, sequer na hora combinada para buscar a criança de volta. Não buscaram. Os meus amigos tiveram que levar e ficou a sensação de que ninguém se deu conta da ausência da criança. Num outro episódio, vi um casal combinando de se ver durante a semana. Detalhe: eles vivem na mesma casa. Me lembrei de um filme que me chamou a atenção, quando marido e mulher marcavam na agenda o horário do sexo na semana.
Mas esse texto não tem a pretensão de puxar a orelha de ninguém, muito menos trazer mais peso ao nosso cotidiano sobrecarregado. Então, vamos ao que interessa: o que podemos fazer? Como diminuir o ritmo e fazer meia volta, depositar o olhar sobre o que realmente faz sentido para cada um de nós, ao invés de simplesmente seguir a marcha? Há muitas respostas para esta pergunta e proporei uma delas, baseada no trabalho da pesquisadora americana, Dra. Brené Brown. Ela sugere em seu livro: Acolha a sua imperfeição, abandone a pessoa que você acha que deve ser, para ser quem você é! Essa ideia de ser sempre mais- mais inteligente, mais bonito, mais magra, mais bem sucedida, mais feliz…. é uma proposta irreal em sua essência, porque dirige nosso olhar para fora, para o outro , e não para dentro de nós mesmos. Curioso é que muito do que desejamos, não faria o menor sentido em nossas vidas. Pare e pense quantos desejos você realizou e perdeu o interesse imediatamente após suprir a falta. Até porque, como já dizia Platão, amamos (desejamos) o que nos falta e deixamos de amar pelo simples fato de suprir a falta. (Já aconteceu isso com você, ao comprar alguma coisa, ou conquistar alguém?)
Que tal fazer o movimento de volta ao simples, cultivar o que já conquistamos e interromper a busca incansável pelo “mais”? Ouso dizer que você está cercado de pessoas e de coisas essenciais para viver com serenidade. Proponho dar voz a Aristóteles que associa o amor, a satisfação pessoal com a palavra Philia. Ele se referiu ao amor pelo encontro, pelas pessoas que já estão ao seu lado, pelos filhos que já tem, pela profissão que é sua. O amor de Aristóteles não é baseado em desejo, mas em valorização da vida que já nos pertence.
Mira Graçano
Consultora de Comunicação
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Crédito imagem: chimebank.com
Publicação: Raquel lima